
O ex-comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Junior, prestou um depoimento explosivo ao Supremo Tribunal Federal (STF) no qual confirmou a realização de uma reunião no Palácio da Alvorada, nos últimos meses do governo Jair Bolsonaro, para discutir uma proposta de ruptura institucional. Segundo o militar da reserva, durante o encontro, um general do Exército ameaçou prender o então presidente caso a proposta de golpe fosse adiante.
O depoimento, obtido por investigadores da Polícia Federal e repassado ao STF, detalha os bastidores da articulação golpista que circulava entre membros do alto escalão do governo e das Forças Armadas no período pós-eleitoral de 2022. Segundo Baptista Junior, a reunião ocorreu em dezembro daquele ano e teve a participação de Bolsonaro, comandantes das Forças Armadas e assessores próximos.
O ponto de maior tensão relatado foi a reação do então comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, ao ser confrontado com uma minuta de decreto que previa a intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a suspensão da posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. “O general foi categórico: se o senhor tentar assinar esse decreto, vai sair daqui preso”, disse Baptista Junior ao STF, relatando as palavras de Freire Gomes dirigidas a Bolsonaro.
Mais grave ainda foi a revelação de que, durante a mesma reunião, o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, teria se colocado à disposição de Bolsonaro. “O almirante afirmou que a Marinha estava pronta para agir, caso o presidente decidisse seguir em frente com a medida”, afirmou Baptista Junior, indicando que havia ao menos uma ala das Forças Armadas favorável à ruptura democrática.
A fala de Baptista Junior corrobora outras frentes da investigação da Polícia Federal, que apontam para a existência de um núcleo civil e militar interessado em anular o resultado das eleições. A minuta de decreto golpista foi posteriormente encontrada na residência do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, e se tornou peça central nas investigações sobre a tentativa de golpe.
O depoimento do ex-comandante da Aeronáutica também revela a divisão dentro das Forças Armadas diante da proposta golpista. Enquanto o Exército e a Aeronáutica rejeitaram enfaticamente qualquer ação fora da Constituição, a posição assumida por Garnier Santos está sendo tratada pelas autoridades como um possível ato de conivência ou participação ativa em uma tentativa de subversão.
A defesa de Jair Bolsonaro nega qualquer plano de golpe e afirma que o ex-presidente jamais cogitou romper com a ordem constitucional. Já o almirante Garnier Santos, procurado pela imprensa, não se pronunciou sobre as declarações de Baptista Junior.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, deve incluir o depoimento no inquérito que investiga a organização e os autores intelectuais da tentativa de golpe de Estado. Investigadores avaliam que as novas revelações podem acelerar pedidos de novas quebras de sigilo e possíveis medidas cautelares contra militares envolvidos.
A cada nova delação ou depoimento, vai se desenhando um retrato mais claro de como o país esteve à beira de uma ruptura institucional. A atuação de oficiais que se recusaram a aderir ao plano é vista por especialistas como decisiva para conter o avanço de uma ameaça real à democracia brasileira.